E quando o sol, posto a meio céu,
tardou em iluminar o dia nulo em si mesmo e a meia claridade fosse um sinal de
tempo tardio. E a rua morta não oferecesse um anseio mínimo de abrigo e
contentamento. E fantasmas noturnos despertassem e ditassem suas crenças
nauseadas, renascidas e trêmulas, nas praças de meio escuro, meio claro de
carnavais mortos, como se fosse noite em dia e tudo pesasse sob a luz frouxa de
um sol decadente, a grande batalha começou...A fome cresceu e deitamos a boca
no prato de concreto e nosso beijo se feriu...Fendeu nossa alma...E corremos
aos templos buscando um deus que não aviltasse nossa vontade, já e antes,
frouxa e sem medida de fé duradoura, como se nossa fome fosse, sempre, a medida
da nossa desdita...O peito aberto das cidades é a catástrofe...
E como vacilássemos entre sono e
vigília, na batalha, nosso sonho pereceu...E buscamos no mar, agitado e verde
de sal, saciar nossa sede...Nossas entranhas arderam e clamamos por alívio
erguendo nossa mão a um céu baixo e sem azul. O azul do nosso clamor...Desejo
de estarmos sempre, ao sol quente, banhando nosso estro...Quimera que a dor
produz...E no fecho da nossa procura, estacamos, inertes, perante nós
mesmos...O sangue nos matadouros é nosso...Sangramos nossa dúvida em versos
indizíveis...Cantamos com voz inaudível...
No princípio do tempo, ocultamo-nos
no escuro de tetos caídos; ruínas do nosso passado que a descrença vertiginosa
das humanidades que nos precederam deixaram como legado nesse chão que hoje
verte o vômito antigo de dores cruentas que elas próprias viveram.
E quando o céu fendeu e em nós
soprou o hálito frio do castigo e da miséria, nossa alma confrangida e
aniquilada, buscou, na construção de castelos de cristal erguidos no interior
das nossas esperanças ultimas e no beijo quente de amantes voluptuosas e sem
pudor e gritamos silenciosos “dá-me teus seios e me ama até a morte e a
ressurreição de tudo que for vida, ou qualquer vestígio de respiro, ainda que
flébil, em nós, o eco do amor se faça”.
Mas o cristal dessa construção
tornou-se pedra e ao seu peso se partiu...Nenhum ai é mais agudo que a
desesperança...Nenhuma rocha sustenta a casa da descrença...O dia se pôs,
assim, insustentável...
Nuvens, como manchas esfumadas,
cobriram o sol posto a meio céu e tudo ruiu num desenho de poucos traços num
poente distante e sombrio, que nós, eu e meu olho ficamos mirando até não
restar nada...
[...] embriagar-se da água que
brota das pedras.
Signos dos dias mortos.
Premonições...
E tudo finda. Mulheres nuas que
se acendem como lâmpadas de desejo e se apagam irremediavelmente no fim da luz.
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