O espectro do sonho - (e a vertigem de acordar)Páginas

segunda-feira, 15 de junho de 2020

O ESPECTRO DO SONHO (e a vertigem de acordar)



A luz do Sol caminha pelo chão, iluminando casas, praças, florestas e pensamentos amolecidos pela lentidão do dia; e nessa manhã alguém afirmou que no fim do dia o cadáver do Sol seria engolido pela noite.
Hora derradeira.
Salas escuras.
O banquete será servido quando o relógio apontar a vigésima hora e a carne ainda estará crua e sem sabor.
Livros antigos.
A saudade não pode ser escrita, descrita, restrita.
Vento. Folhas arrancadas.
Folhas de arvores que se desnudam sem pudor.
Inocência verde.
À tarde, depois de construída a atiradeira, e a pedra ter sido arremessada, só restou implorar: “voa passarinho, voa, que não atiro mais pedras”. Ah! Impossível deter o inevitável, ele não voou... A lata que serviu de urna para o pássaro morto, enferrujou, apodreceu... A memória não enferruja, não se desfaz, mas, apodrece sozinha enquanto padece de morte o sol no fim do dia que agoniza.
A tarde e sua calma. A tarde e seu significado, e seu martírio, e seu enigma. Ela ama sua alma iluminada pelo sol.
Ela pertence à memória dos deuses que habitam o sempre.
O poente se avermelha de piedade.
[...] um pássaro morto é único.
Árvores antigas contemplam o feroz espetáculo de renúncia do sol que se ajoelha perante a noite soberba que se agiganta e abraça o sol com tamanho vigor e piedade que ele adormece indefeso para no dia seguinte se levantar majestoso. [...] o princípio do esquecimento se revela.